Por que algumas pessoas continuam tomando decisões ruins, mesmo sabendo que vão se prejudicar?
30/07/2025
(Foto: Reprodução) Por que a gente insiste no erro? Cientistas explicam que não é por falta de atenção
Por que a gente insiste no erro? Essa foi a pergunta que guiou um estudo liderado pelo neurocientista Philip Jean-Richard-dit-Bressel, da Universidade de Nova Gales do Sul, na Austrália. A pesquisa, publicada na revista Nature Communications Psychology, concluiu que parte das pessoas mantém comportamentos que causam prejuízo mesmo quando estão conscientes das consequências.
A explicação não é falta de motivação, distração ou desconhecimento. Segundo os cientistas, o problema está na dificuldade que algumas pessoas têm de ajustar suas ações com base em novas informações. Em outras palavras, mesmo sabendo que uma atitude é prejudicial, elas continuam agindo da mesma forma — um padrão comportamental descrito como “compulsivo”.
Insistir no erro pode estar ligado a traços compulsivos e baixa flexibilidade cognitiva.
Liza Summer/Pexels
Os pesquisadores testaram 267 pessoas de 24 países em um jogo online simples: os participantes escolhiam entre dois planetas, cada um levando a uma nave que poderia dar pontos ou tirar tudo o que havia sido conquistado até então. Com o tempo, era possível perceber qual planeta causava a perda — e mudar de estratégia.
Mas uma parcela dos jogadores seguiu errando, mesmo depois de ser informada claramente sobre qual escolha era a errada.
Três perfis de comportamento
Durante o experimento, os participantes se dividiram em três grupos:
Sensíveis (26%): perceberam rapidamente quais escolhas causavam punições e ajustaram o comportamento.
Desatentos (47%): não entenderam sozinhos, mas mudaram de estratégia quando receberam orientação.
Compulsivos (27%): continuaram tomando decisões ruins, mesmo após serem avisados do erro.
“O mais surpreendente é que os compulsivos sabiam exatamente o que estavam fazendo. Eles conseguiam explicar a lógica do jogo e, ainda assim, mantinham a estratégia errada”, disse Jean-Richard-dit-Bressel. “Isso indica uma dificuldade em incorporar novas informações a ponto de mudar o comportamento.”
Traço estável — e possivelmente ligado à idade
Seis meses após a primeira rodada do experimento, os participantes foram convidados a jogar novamente. A maioria manteve exatamente o mesmo padrão de comportamento, o que sugere que não se tratava de um "dia ruim", mas de traços persistentes de personalidade.
O estudo também observou que pessoas com mais de 50 anos foram mais propensas a apresentar o perfil compulsivo, possivelmente por uma menor flexibilidade cognitiva — ou seja, menos capacidade de adaptar pensamentos e ações diante de novas informações.
Como isso se aplica ao dia a dia
Esses achados ajudam a entender por que algumas pessoas:
continuam fumando mesmo após um diagnóstico de doença pulmonar;
gastam mais do que podem, mesmo após se endividarem;
repetem relacionamentos tóxicos, apesar dos alertas;
seguem padrões alimentares prejudiciais, mesmo sabendo os riscos.
A pesquisa também lança luz sobre comportamentos autodestrutivos, como o vício em jogos de azar, drogas e álcool. “A pessoa sabe que vai se prejudicar, mas continua. O problema não é ignorância, é uma desconexão entre saber e agir”, afirma o pesquisador.
Impacto nas campanhas de saúde pública
Os resultados desafiam a ideia de que basta informar para mudar comportamentos. Muitas campanhas — sobre cigarro, álcool, alimentação ou finanças — apostam apenas em conscientização. Mas o estudo mostra que isso não funciona para todos.
“Informar é suficiente para a maioria das pessoas, mas não para todos”, diz Jean-Richard-dit-Bressel. “Para quem apresenta esse perfil compulsivo, talvez seja necessário usar outras estratégias, como terapias comportamentais, reforço positivo ou intervenções mais diretas.”
“O estudo aponta que nem sempre falta motivação ou informação. Às vezes, o problema é mais profundo: uma falha em conectar ação e consequência”, conclui Jean-Richard-dit-Bressel.
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